Marcela Ayres
Gastos
inflacionados com saúde serão facilmente identificáveis
pela Receita este ano
São Paulo – Todos os anos milhares de contribuintes caem
na malha fina. Só em 2010, 700 mil declarações foram
barradas – quase 3% do total. Seja por descuido ou pela
notória vontade de escapar das garras do Leão, um motivo
em comum acende o alerta da Receita: a discrepância
entre o dado indicado pelo contribuinte e a versão
apurada na outra ponta da cadeia.
A tarefa de atestar – ou desautorizar – os gastos e
rendimentos informados pela pessoa física cabe aos
hospitais, imobiliárias, empresas e bancos. Isso
acontece porque eles também são obrigados a declarar
todas as transações registradas ao longo do ano. O
resultado desse cruzamento chega amargo para quem não
consegue provar as informações lançadas. A multa é de
75% sobre o valor sonegado, pulando para 150% nos casos
em que há comprovado intuito de fraude.
Embora o prazo para a entrega da declaração ainda não
tenha acabado, as conseqüências da fiscalização já
começam a ser divulgadas pela Receita. Na última semana,
investigações identificaram que a proprietária de uma
clínica de estética em Aracruz, no Espírito Santo, teria
negociado cerca de 2 milhões de reais em recibos frios.
As notas foram compradas por quase 300 contribuintes, a
maioria de alta renda, ao longo dos últimos três anos.
Um dos grandes desafios do governo era justamente checar
a procedência dessas despesas. Diferente dos gastos com
educação, por exemplo, cuja dedução é limitada a
2.380,84 reais por pessoa, o dinheiro despendido em
tratamentos e consultas pode ser inteiramente abatido.
Logo, a submissão desses custos tem o potencial de mudar
drasticamente o saldo fiscal contabilizado na
declaração, diminuindo a carga de imposto devido ou
aumentando o valor da restituição.
Como clínicas e hospitais não precisavam apresentar o
comprovante dos serviços prestados até o ano passado,
muitos contribuintes eram generosos na hora de lançar
esses dados, inventando despesas ou inflacionando
valores. Este ano, o Fisco fechou o cerco a estes
estabelecimentos, exigindo a entrega da Declaração de
Serviços Médicos e de Saúde, a chamada Dmed.
Não por menos, é hora de redobrar os cuidados com os
gastos dessa natureza. "Eu diria que despesa médica é o
problema número um das declarações que caem malha fina",
afirma o advogado tributarista Samir Choaib. "Costumam
aparecer desde valores errados até a inclusão de
tratamentos de pessoas que não são dependentes," pontua.
A regra para dedução é simples. O contribuinte só deve
lançar os gastos com saúde feitos em seu benefício ou de
seus titulares. Para tanto, é preciso que o dinheiro
tenha saído do seu bolso. Outro pré-requisito é que
notas e recibos tenham sido devidamente guardados.
"A cada ano que passa, a Receita tem ficado cada vez
mais veloz no processamento das informações", afirma o
advogado Edson Pinto. "Se antes a fiscalização só
acontecia a partir de determinada renda, hoje o acesso à
informática permite que qualquer incongruência seja
muito mais simples de detectar", finaliza.
Conheça
outros erros comuns de quem cai na malha fina:
Omissão da renda tributável do dependente: Ter
outra pessoa como dependente implica a incorporação de
todos os seus bens, direitos e obrigações. Logo, se um
pai declara um filho que começou a estagiar como
dependente, o dinheiro recebido no trabalho do filho
deverá constar na sua declaração. Dependendo de quanto
for este montante, será possível inclusive que a renda
tributável do titular se enquadre em uma nova e mais
pesada faixa de incidência de IR.
Omissão de receitas de diferentes fontes pagadoras:
Quem muda de trabalho ao longo do ano pode deixar passar
batido o lançamento do dinheiro recebido em um ou outro
local. Como as empresas necessariamente prestarão essa
informação ao Fisco, aumenta a chance do Leão
identificar eventuais sonegações.
Omissão do recebimento de aluguéis: O ganho com
aluguéis obedece a mesma tabela e é tributado exatamente
como o salário pago por uma empresa. Da mesma forma, ele
deve ser obrigatoriamente informado na declaração.
Quando recebido de pessoa jurídica, esse rendimento é
tributado na fonte. Quando os inquilinos são pessoas
físicas, o recolhimento acontece mensalmente via
carnê-leão. Neste caso, o pagamento do imposto é de
inteira responsabilidade de quem recebe o dinheiro.
Omissão do recebimento de pensão alimentícia: Há
quem ache que a pensão alimentícia não precise ser
declarada. Outros deixam de lançar a informação por
considerarem injusto sofrerem tributação sobre um
dinheiro que será usado para a criação dos rebentos. A
verdade é que o recebimento de pensão necessariamente
sujeita-se às garras do Leão. Do lado de quem paga, a
pensão alimentícia acordada judicialmente pode ser
deduzida na íntegra da renda tributável. Já para quem
recebe, os recursos são tratados como um salário e são
sempre acrescentados à renda tributável do titular da
declaração.
Aparição em mais de um CPF: Situações que
envolvem a colaboração de familiares costumam suscitar
dúvidas em relação à declaração do IR. É o caso de
filhos que dividem entre si a responsabilidade de pagar
o plano de saúde dos pais. É bom lembrar que o CPF de
cada pessoa só pode aparecer em um formulário do Imposto
de Renda. Portanto, os filhos terão que decidir quem
colocará o pai como dependente e apenas quem for o
eleito poderá deduzir os gastos feitos por ele com o
pai.
Inclusão não permitida de dependentes: O simples
fato de ter ajudado financeiramente um conhecido para
uma causa que permite abatimento (como despesa médica ou
mensalidade de escola particular) não dá ao contribuinte
a oportunidade de descontar esse gasto de sua renda
tributável. Para fazê-lo, é preciso que o beneficiário
seja seu dependente. E existem critérios para essa
inclusão. Filhos de pais separados só podem ser
incluídos como dependentes na declaração de quem detiver
a guarda judicial. Também podem ser incorporados em um
só formulário cônjuges e companheiros, inclusive
homossexuais. Para filhos, enteados, netos e bisnetos, a
idade limite é de 21 anos ou 24 anos se estiverem
cursando faculdade. Pais e avós só podem ser incluídos
como dependentes se tiverem recebido rendimento,
tributável ou não, de até 17.989,80 reais em 2010. |